OS MANUSCRITOS PERDIDOS DE CHARLOTTE BRONTE

 




Passeando num shopping da cidade despretensiosamente em plena segunda-feira de Carnaval ao levar meu filho em um bailinho para crianças, eis que me deparo com uma pequena livraria a céu aberto. Obviamente que aquilo chamou minha atenção. E, assim, ao deixar marido e filho na área de diversão e recreação do shopping rumei sem pensar duas vezes para lá. Meu objetivo era tentar descobrir alguma relíquia perdida no meio daqueles "livros da moda" e baratos (best-sellers e pseudoauto-ajudas da vida) que eles costumam vender nesses pequenos stands no meio de shoppings e supermercados. 

E eis que para minha surpresa depois de me deparar com alguns clássicos e outros filosóficos (e separar alguns) e andar pelo espaço por duas vezes, de repente esbarro num Charlotte Bronte capa dura e tudo! A princípio pensei se tratar do velho e bom Jane Eyre, que eu já tenho. Mas olhando bem o livro percebi que era uma relíquia da qual não tinha conhecimento: OS MANUSCRITOS PERDIDOS DE CHARLOTTE BRONTE! Pensei logo comigo: --- de que se trata isso?!

Mais uma vez sem pensar duas vezes tratei logo de catar o livro para mim antes que algum outro caçador de relíquias (apesar de ser difícil encontrá-los em shoppings) surgisse do nada e disputasse essa comigo. Por estar plastificado e ter ainda um compromisso a cumprir com a criança, só pude examinar seu conteúdo mais detalhadamente mais tarde quando cheguei em casa. 

Para minha surpresa maior ainda trata-se de uns manuscritos de contos escritos por Charlotte bem antes da publicação de Jane Eyre, datados de sua adolescência. Mas se engana quem pensa que a surpresa para por aí. Tais manuscritos foram encontrados dentro de um livro antigo (The remains of Henry Kirke White, de um jovem poeta falecido aos 21 anos) que pertenceu à mãe das irmãs Bronte (Maria Branwell) entre 1810 até sua morte em 1821 e que após o falecimento precoce de toda a família entre os anos de 1825 e 1861, saiu de Haworth, na Inglaterra (residência dos Bronte), em 1869 para circular pelos Estados Unidos por quase 150 anos (!) nas mãos de diversos colecionadores até voltar em definitivo para o Bronte Personage Museum em 2016.

O Bronte Personage Museum administrado pela Sociedade Bronte (organização mundial fundada em 1893) é um museu criado em Haworth para preservar a história da família Bronte, onde estão reunidos objetos pessoais, móveis e manuscritos pertencentes a eles. A Sociedade além de preservar a memória da família de autoras famosas da Literatura Universal, oferece bolsas de estudos para a compreensão de suas vidas e obras, um programa de artes contemporâneas, explorando suas ligações com a literatura "e encontrando novas formas de analisar e trabalhar a coleção". 

E as curiosidades do livro não param por aí! Ao adquirir a obra do jovem poeta lá em 1810, Maria a levou para casa e a guardou em segurança até que em 1812 com a morte de seu pai em Penzance, na Cornualha, a decisão de passar a residir com uma tia em Yorkshire e mais o casamento relâmpago com Patrick Bronte a levaram a pedir que fossem despachados todo o resto de seus pertences em um baú por um navio que deveria chegar são e salvo em seu destino. Entretanto, não foi bem o que aconteceu. Em algum momento da viagem o navio sofreu um quase naufrágio e os pertences de Maria foram praticamente todos destruídos, restando apenas o livro e poucos outros objetos para que pudesse começar sua vida matrimonial com o Reverendo Patrick. 

Logo, o livro passou a ter um grande valor sentimental para ela e posteriormente para Patrick e os filhos, que passaram a fazer inúmeras anotações, dedicatórias, marcações e desenhos em suas páginas. Mas o que continua sendo um grande mistério é como os manuscritos da jovem Charlotte foram parar no meio do livro, visto que não fora seu pai que os colocara ali e tendo passado por inúmeras mãos de colecionadores por tantos anos desde o primeiro leilão realizado em 1861, após a morte de Patrick. É um mistério que os estudiosos da obra das irmãs Bronte ainda tentam descobrir. 

E, como se vê, o livro pertencente à Maria Branwell sobreviveu a uma verdadeira epopeia para chegar são e salvo até os nossos dias. 

P.S: Para quem quiser mais informações sobre a Sociedade e o Bronte Museum, basta acessar os seguintes sites:

 1) www.bronte.org.uk/support-us 

2) www.bronte.org.uk/bronte-shop


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

DINSDALE, A. & others. Os manuscritos perdidos de Charlotte Bronte. Trad. Thereza Christina Rocque da Motta. 1 ed. São Paulo: Faro Editorial, 2019.  

Nenhum comentário:

Postar um comentário