POEMA E POESIA OU POESIA E POEMA - MAS, AFINAL O QUE É POESIA E O QUE É POEMA?




Uma primeira definição para poesia e daquelas mais simples seria dizer que ela é todo o texto escrito em versos. Entretanto, o problema é que poesia NÃO é apenas todo o texto escrito em versos. E que na verdade o que se escreve e se materializa é o poema e não a poesia. Qual é a diferença então entre poesia e poema ou poema e poesia? A diferença reside no fato de que a poesia numa definição da origem da palavra, segundo Massaud Moisés, em seu Dicionário de Termos Literários, vem do grego poiesis, que significa “ação de fazer alguma coisa, criar no sentido de imaginar”.

Ou seja, a poesia seria o estado ainda abstrato do poema, o momento da composição, enquanto ela ainda está na fase da imaginação, da procura das palavras, das imagens que se conectarão de acordo com o desejo e o planejamento do poeta para produzir o poema imaginado.

Podemos dizer que seria também algo equivalente ao conselho de Drummond nesse trecho de seu poema, Procura da poesia:

[...]

Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.

Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.

Por sua vez, o poema propriamente dito é o produto concreto e acabado dessa imaginação colocada para funcionar de forma poética. É o poema terminado, materializado na folha em branco, pronto para ganhar o mundo e ser lido pelos leitores e apreciadores de poesia. Esteja ele vestido ou trajado no tema ou assunto que for, que o poeta escolheu para se expressar poeticamente.

Mas, porém, entretanto, contudo, todavia... o poema (e não mais a poesia) é um tipo de texto que ALÉM de ser escrito em versos precisa conter alguns elementos que o distingam da prosa. E é justamente aí que mora todo o encanto, a beleza e a magia de um texto poético. Sim, mas que elementos são esses?

Esses elementos são os chamados elementos poéticos ou elementos da poesia, os quais englobam: rima, musicalidade, ritmo, métrica e figuras de linguagem (metáfora, sinestesia, aliteração, hipérbole, assonância, entre outras), a fim de formar imagens e compor um poema de qualidade, digamos assim.

Mas voltemos para a definição de Poesia. Tal como a literatura, ela não possui uma definição específica, mas sim diversas definições de acordo com os mais variados filósofos, teóricos e críticos literários, além, claro dos que mais entendem de fazer poesia: os poetas.

Para o professor Pedro Lyra (p. 7, 1992), por exemplo:

[...] a poesia está no mundo originariamente, antes de estar no poeta ou no poema e isso pode ser comprovado pela simples constatação popular de que determinados objetos/situações do mundo são “poéticos” ela tem sua existência literária decidida nesse trânsito do abstrato ao concreto, do mundo para o poema, através do poeta, no processo que a conduz do estado de potência ao de objeto. 

Já o professor e crítico literário Carlos Felipe Moisés (p. 12, 1996) admite que:

a “poesia seja um jogo de subentendidos, linguagem cifrada, repleta de nuanças e ambiguidades, constituindo assim um poderoso desafio à nossa sensibilidade e argúcia”.

O crítico literário Afrânio Coutinho (p. 86, 2008) nos diz que:

A poesia é palavra, e é a palavra o primeiro elemento formal. Pela palavra o poeta domina e organiza sua experiência e a comunica por meio de imagens e símbolos. Pela palavra ele constrói seus castelos, enche-os de imagens. Cria forma, na qual há uma relação harmônica entre a parte e o todo, entre a inspiração e a expressão. Essa forma, unidade orgânica, é o poema. Mas a palavra da poesia é específica. Há uma linguagem poética própria, com grande carga lírica e emocional, assim diferindo da científica e da coloquial. Essa língua poética é composta de um vocabulário alinhado em ordem peculiar e carregado de sentidos próprios e de ambiguidade.

Para o poeta Mario Faustino (p. 28-29, 1976):

[...] poesia para mim é instrumento. [...] Instrumentos de muitas outras, quero eu dizer. Meio, por exemplo, de comover os homens; meio de os alegrar; meio de ensiná-los. [...] Pois, de certo modo, todo poema é eficiente, por mais tristes que sejam seus temas, sua anedota, suas sugestões, suas alusões — um bom poema sempre “deleita” o leitor saudável e competente.

Vejamos outras tentativas de definição:

Todas as literaturas começaram pela poesia. O homem começou cantando seus mitos, celebrando seus heróis, seus guerreiros, embora depois descobrisse outros temas. [...] A poesia não se escolhe e não é uma profissão. Poesia é a arte de causar emoções através do manejo das palavras. Um verso é uma coisa dita com certa cadência e não há leis para a poesia. É uma arte não menos misteriosa do que a música, talvez seja mais misteriosa. [Jorge Luis Borges]

A poesia é mais profunda e mais filosófica que a história. [Aristóteles]

A poesia é um difícil ofício de expressar a vida, naquilo que ela tem de belo e dramático. [Ferreira Gullar]

Poesia, irmã mais velha de todas as artes, e mãe da maioria delas. [William Congreve]

A poesia é a religião original da humanidade. [Novalis]

A poesia é a revelação de um sentimento que o poeta acredita ser interior e pessoal, mas que o leitor reconhece como próprio. [Salvatore Quasimodo]

A pintura é poesia muda; a poesia, pintura cega. [Leonardo da Vinci]

O reino de ação da poesia é a linguagem. [...] a essência da poesia deve ser concebida pela essência da linguagem. [Martin Heidegger]

A poesia sempre me pareceu um mistério, você não sabe dizer o que é, ela acontece ou não acontece. [Hilda Hilst]

Todas as coisas possuem seu mistério e a poesia é o mistério de todas as coisas.[Federico Garcia Lorca]

A poesia faz imortal tudo quanto é melhor e mais belo neste mundo. [Percy Bysshe Shelley]

Poesia não tem hoje nem ontem. Poesia é sempre. [Marisa Lajolo]

Mas é o poeta, tradutor e ensaísta Octávio Paz (p. 15, 1982) que na sua tentativa de definição de poesia, quem parece resumir, ou antes, unir todas as outras num só pensamento: 

A poesia é conhecimento, salvação, poder, abandono. Operação capaz de transformar o mundo, a atividade poética é revolucionária por natureza; exercício espiritual, é um método de libertação interior. A poesia revela este mundo; cria outro. Pão dos eleitos; alimento maldito. Isola; une. Convite à viagem; regresso à terra natal. Inspiração, respiração, exercício muscular. Súplica ao vazio, diálogo com a ausência, é alimentada pelo tédio, pela angústia e pelo desespero. Oração, litania, epifania, presença. Exorcismo, conjuro, magia. Sublimação, compensação, condensação do inconsciente. [...] Experiência, sentimento, emoção, intuição, pensamento não-dirigido. Filha do acaso; fruto do cálculo. Arte de falar em forma superior; linguagem primitiva. Obediência às regras; criação de outras. Imitação dos antigos, cópia do real, cópia de uma cópia da Ideia. Loucura, êxtase, logos. Regresso à infância, coito, nostalgia do paraíso, do inferno, do limbo. Jogo, trabalho, atividade ascética. Confissão. Experiência inata. Visão, música, símbolo. Analogia: o poema é um caracol onde ressoa a música do mundo, e métricas e rimas são apenas correspondências, ecos, da harmonia universal. [...]

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

COUTINHO, A. Notas de teoria literária. 1 ed. Petrópolis: Vozes, 2008.

FAUSTINO, M. Poesia – experiência. 1 ed. São Paulo: Perspectiva, 1976.

LIRA, P. Conceito de poesia. 2 ed. São Paulo: Ática, 1992.

MOISÉS, F. C. Poesia não é difícil: introdução à análise de texto poético.  1 ed. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 1996.

PAZ, O. O arco e a lira. Trad. Olga Savary. 2 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982.

REACHERS, S. Poesia em 500 citações: algumas das melhores definições e reflexões de todos os tempos sobre a poesia e o poema, o poeta e o fazer poético. 1 ed. São Gonçalo: Edição Independente, 2018.

 












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